terça-feira, 29 de julho de 2014

29 de Julho de 2014 - Os sapatos



Era um homem que gostava de andar. Tanto andava que ficava com bolhas nos pés e depois com feridas e depois parado. Tinha sido sempre assim, até que um dia pensou que o andar era o que o alentava. Tinha, por isso, que resolver o que o fazia afrouxar. Foi buscar um saco, enfiou-lhe todos os sapatos e foi dá-los a quem não andava. Eram eles que lhe faziam as bolhas nos pés.


sábado, 19 de julho de 2014

Ponha Aqui o Seu Pézinho


Parece hipócrita nos dias que correm, mas é merecedor de alguma atenção o facto constatado pela primeira pessoa do singular que anda a germinar por esse mercado laboral afora: os sapatos têm que ser fechados. Faça chuva ou faça sol, tenhamos bolhas ou não, pés chatos ou porreiros, calos ou pele fresquinha, joanetes ou filipetes, fungos ou esterilizações, unhas bonitas ou feias, encravadas ou com ordem de soltura, é mandatório que as pessoas não mostrem a pecaminosa, lasciva e ofensiva unha do dedo grande de qualquer um dos pilares do nosso corpo. O pé está para os tugas como o ombro é para os afegãos. Mostrá-lo é o novo e hilariante pecado mortal do ocidente. Criado por quem? Por Deus. Porquê? Porque nenhuma pessoa teria capacidade imaginativa ao ponto de criar uma norma que vai contra o bem estar da própria espécie terrena, fazendo com que as consequências da sua criação se virassem contra ela própria. É que trabalhar num país em que há dias que atingem a módica temperatura de 41º com sapatos fechados é como ir para o deserto do Sahara passar o dia com uma samarra encasacada e uma manta de retalhos de felpa. O calor é tanto que mesmo que o pé tenha sido, em tempos, uma zona do corpo saudável , com as falanges e falanginhas em bom estado de conservação e com uma aparência aceitável, começa imediatamente a processar uma mutação corpórea visível a olho nú. Mas o que está aqui em causa não são propriamente os pés. É a cabeça. A falta de liberdades e a invasão do individualismo que diferencia cada um de nós do outro começa por pequenas coisas. O Mundo está carregado de comportamentos com tipologias do género e todos eles, sem excepção, começaram por pequenos agouros. As tentativas de igualar e tabelar cada indivíduo por moldes, sem possibilidade de expressão do próprio querer, são diariamente demonstradas através de graus mais ou menos intensos, por vários pontos geográficos onde existem seres humanos. Mas o pior é que estas normas têm o intuito separatista de uma identificação hierárquica vertical de maneira a que os superiores sejam identificáveis automaticamente pelos demais através de roupagens classicistas e desiguais. A ralé veste-se como eles querem, em modo de produção fabril com aparências replicadas. Eles vestem-se como lhes prouver, pelo poder subentendido na liberdade de escolha, de expressão e superioridade escalada pelos próprios. E eu pergunto-me a mim própria o porquê da aceitação generalizada destes ditames. Se fossemos mais produtivos e o mérito dependesse do que trazemos calçado o Mundo era um lugar perfeito. Enfiávamos os pés no sapatinho mágico à laia da menina do Feiticeiro de Oz e plim! Ficávamos instantaneamente transformados no funcionário do mês, do ano, da vida. Não ia ser preciso estudar, lutar pelo saber, fazer para aprender. Como até agora ainda não me deram uma explicação plausível para esta norma social contemporânea (quando eu era nova nunca ouvi a frase "os sapatos têm que ser fechados") eu não a acato de bom grado. Toda e qualquer tentativa de me igualarem ao outro à força, seja pelos pés, mãos, cabelo, unhas das mãos ou o que for é sinónimo de perda da minha liberdade. E se pelo Mundo fora já assistimos a ditaduras desumanas com uma apatia brutal e distante, pelo menos que me deixem os pés em paz. Eu prometo que cumpro as funções que me são designadas com entrega, dedicação, profissionalismo e inconformismo, claro.

sábado, 12 de julho de 2014

PPR - Plano Para a Reforma


A Terra não gira à volta do Sol. O Galileu que me perdoe, mas o seu lugar na história já teve os seus dias de glória. A Terra gira à volta do dinheiro.O Sol passou a papel secundário por ter sido eclipsado pela moeda. Segundo os estudos mais recentes que apontam para um aumento da esperança de vida da população ocidental para uma média de uns belos oitenta anos e calculando que uma pessoa se torna maior de idade aos dezoito, com uma subentendida capacidade de começar a arranjar técnicas de sobrevivência e autonomia, o resultado é que o tempo estimado que cada um de nós perde a tentar arranjar graveto é de sessenta e dois anos. Este facto, aliado aos consecutivos aumentos da idade da reforma, pressupõe igualmente um futuro laboral repleto de trabalhadores com alzheimer, andarilhos, incontinência e tudo o que acarreta o peso da idade. Portanto, como a obrigatoriedade do sustento advém de regras peculiares que transcendem o bom-senso e a hegemonia social, o futuro da vida coexiste com a ideia de que o ganha-pão de cada um de nós tenha que ser ganho de qualquer maneira até à hora de irmos desta para melhor. Seja a trabalhar, seja a tentar arranjar trabalho (estou a imaginar-me numa entrevista com a placa dentária a cair-me enquanto falo), seja a roubar, seja a desviar, seja a magicar técnicas para adquirir o bem material mais imaterial do Mundo: dinheiro. É que oitenta por cento desta fonte da ganância não existe. Na realidade, só vinte por cento do dinheiro que dizem existir por aí é que é de facto palpável. Todo o resto é virtual. Mas isso é só um pormenor porque desde que a conta bancária aprovisione os pagamentos das contas e que o saldo permita comprar e adquirir coisas, o facto do dinheiro não existir fisicamente não interessa a ninguém. Só aos que o gerem. Para que possam especular sobre  a sua existência, sobre o seu valor e inventar milhares de histórias da carochinha sobre o que lhe está a acontecer, mesmo que se tratem de histórias rocambolescas de mentes dementes que não deixam, pelo mesmo motivo, de ser brilhantes e deveras criativas. Nós, o povão, caímos que nem patinhos nas canções dos bandidos. Eu, pelo menos, caio. Por enquanto. O meu senhorio não me parece ser uma pessoa atreita a clubes de trocas e economias alternativas. Logo, tenho que me certificar todos os meses que garanto o dinheiro da renda para lhe pagar a casa. Depois, atrás da casa, vem tudo o que faz com que a mesma seja um lugar habitável com o mínimo de conforto: a água, o gás, a eletricidade, a internet. E se a ideia de propor ao senhorio um sistema de trocas já é uma utopia, essa mesma ideia, quando aplicada a um universo de empresas multinacionais multimilionárias, torna-se surreal e passível de um aborto antes do seu próprio concebimento. Posto isto, visto que eu também faço parte integrante do número de pessoas que compõem a grande massa movível a pilim e que para novo ninguém vai, tem-me assaltado um pensamento violento sobre um futuro que cada vez mais se começa a assemelhar a um presente. Revejo-me numa imagem recorrente, com andarilhos, a levantar-me todos os dias para tentar arrecadar uns trocos para sobreviver. A visão decadente normalmente bifurca para uma bipolaridade emocional automática - nunca sei se hei-de rir ou chorar. Mas uma acaba por compensar a outra e acabo sempre por retomar o equilíbrio necessário para fazer planos. Aquele que me parece mais fiável e tangível é o de comprar um terreno, construir uma cabana com painéis solares, plantar tudo com as minhas próprias mãos, comprar galinhas para ter ovos (proteínas) e fazer um furo de água. Assim não tenho que me preocupar em arranjar nota para viver. Crio uma vida auto-sustentável, afastada do rol de gente que vai compor o mercado de trabalho daqui a vinte anos, arrastando-se com os andarilhos, com auscultadores que indicam o percurso para o seu posto de trabalho porque já têm alzheimer e com mochilas cheias de fraldas para a incontinência e cola para as placas dentárias. O único senão deste plano para a reforma, contudo, não me deixa totalmente descansada e aliviada. Para o levar a cabo preciso de ter uma coisa que é imperativa para aquando da aquisição do terreno e afins: dinheiro. 

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Menos que nada


A vida já é estranha, mas há dias que são um abuso. Não sei se este começo é o mais indicado para o caso, mas hoje sinto que não sei nada. Aliás, normalmente sinto que sei muito pouco. Pouco é favor, por isso faço-me esse favor a mim própria porque a zeros ninguém está. Cada vez mais me convenço que tudo é relativo, que cada partícula da existência é mutável, que cada par de olhos vê de uma maneira única, que cada pessoa é um caso e que tudo está interligado. Daí o caos. Daí a estranheza. Daí a incerteza. Vai daí talvez muitos considerem que o facto de uma senhora estar a desfalecer num autocarro pelo calor excessivo do dia em si e pela multidão apinhada, acompanhado por uma apatia geral, não seja estranho. Mas quando alguém tenta ajudar e pede às pessoas que abram as janelas do mesmo autocarro para a senhora ter algum ar em circulação e não se avista uma única reação advinda de um único indivíduo presente no mesmo autocarro, as coisas não têm duas leituras possíveis: a vida é estranha porque as pessoas são estranhas. Como não sei quase nada não tenho capacidade para definir este estado generalizado que assola a maioria que não reage a nada nem a tudo. Não reagem. Ponto. O pedido de abertura das janelas de trás foi gritado por várias vezes. As pessoas só olharam. Não esticaram o braço para virar a maçaneta que podia melhorar consideravelmente o estado de saúde de uma pessoa. Então tentei perceber o porquê. Tentei pôr-me no lugar das pessoas. Depois de algum esforço concluí que é escusado. Não consigo percebê-las. Entretanto, depois desta tentativa falhada de vestir a pele dos outros, comecei a pensar: "mas como é que está mais calor dentro do autocarro do que na rua, à torreira do sol?". Como estava suficientemente perto do motorista para falar com ele sem gritar disse: "Não acha estranho estar este calor aqui dentro?", ao que o senhor respondeu "É o ar que está avariado.". Ao que eu retorqui: "Mas eu sinto ar a vir de cima, só que é quente." Ao que ele exclamou: "Sim. O ar frio está avariado, mas como eles dizem que temos que ter sempre o ar ligado, eu liguei no quente." 
Tive que paragrafar o texto. Hoje não estou em condições para escrever mais. Fico-me por aqui. Ou talvez vá mesmo para o Tibete. Não sei. Estou baralhada. 

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Carta Aberta a um Vizinho Fechado


"Há sempre um vizinho que degenera." Alguém disse. Eu tenho um. O do palacete. A mim tanto se me fazia a existência do senhor não fosse o caso da janela do meu quarto estar diretamente virada para uma parte do seu exótico e profuso jardim que, por sua vez, é o ponto de passagem para a pessoa em questão entrar e sair de casa todos os dias. Para agravar a situação, eu moro no rés-do-chão. Digamos que se a distância fosse ligeiramente maior eu teria hipóteses de conseguir atingir uma maior quantidade de momentos de calmia e serenidade - não ia conseguir ouvi-lo. Nunca fui daquelas de ligar em demasia ao que os outros dizem (os meus pais que o digam). Mas quando aquilo que é dito é sobre mim sem a decência de ser para mim, nos olhos, com a agravante de se tratar de um mal-dizer constante, snobe, prepotente, com laivos de tirania, eu saio da órbita e disparo tipo meteorito kamikase, pronta para colidir com outro mundo sem dó nem piedade. Mas como tenho tempo de sobra para respirar até dez (ou até mil) e para canalizar os maus pensamentos para um cofre onde ficam bem guardados, resolvi escrever uma carta aberta ao tal senhor. Pode ser que um dia, numa hipótese tão remota como o planeta Kepler 22-b, ele leia esta carta.

"Exmo. Senhor:
Não lhe pergunto se está bem de saúde porque consigo constatá-lo diariamente através da energia prolixa com que dita ordens aos seus subalternos. Também não lhe pergunto se a vida lhe corre de afeição, porque através da janela do meu quarto consigo perceber que se sente deveras incomodado e importunado por me ter como vizinha. Esse é o motivo que me leva a escrever-lhe esta missiva. 
Não foi com intenção de constituir uma fonte para o seu mal-estar que vim para aqui viver. Longe disso. Agrada-me saber que aqueles que me rodeiam estão bem, tentando fazer o que está ao meu alcance para contribuir para o seu bem-estar. Contudo, no que respeita à sua pessoa, não estou a conseguir.
Reparei que ficou deveras incomodado por ter posto umas cortinas de fios na janela do meu quarto quando proferiu a sua indignação e consternação pelo sucedido. Nunca pensei que tal ato pudesse constituir fonte de tanta perturbação. Passo a explicar-lhe o porquê da minha escolha decorativa das cortinas de fios: a janela do meu quarto vive à sombra do seu palacete pelo que prefaz uma luz natural pouco abundante para o seu interior. As cortinas de fios, por serem de fios, permitem achar um meio-termo, um compromisso, entre a privacidade necessária de um quarto de dormir e a oportunidade de poder usufruir em simultâneo de algum rasgo da luz natural do dia. 
Constatei que também lhe faz espécie que as janelas da casa onde vivo estejam sempre entreabertas. A sua dissertação diária sobre o assunto que teoriza em torno de uma casa sem ninguém, na qual não se ouve um barulho que seja e que tem as janelas sempre entreabertas não deve continuar a ser fonte de desespero para sua excelência porque cá em casa está sempre alguém e as janelas entreabertas servem o único fim de arejar o interior. Não se ouvem barulhos porque felizmente somos todos muito civilizados e sabemos viver sem que para isso tenhamos que usar decibéis que firam as susceptibilidades dos outros.  
Ontem gritou com uma das suas subalternas num tom aflitivo sobre o facto de nós termos atirado cascas de tinta para o chão do seu jardim. Não foi minha intenção provocar tal consternação, mas as grades que vossa excelência colocou nas janelas da casa onde vivo foram limpas. Contudo, como são velhas e a tinta está a descascar não se conseguiu evitar que caíssem alguns pedaços dessa tinta antiga para o seu esmerado jardim. Quando se exaltou disse igualmente que eu deveria ter ido tocar à sua porta para lhe pedir autorização para limpar as grades. Peço desculpa pela falha em questão mas pensei que como as grades estão colocadas nas minhas janelas da minha casa eu pudesse limpá-las de vez em quando. Fica então acordado que a partir de hoje é sua excelência que fica responsável pelo ato de limpeza das grades com a ressalva de que a mesma garanta o minimo dos níveis de higiene, evitando o crescimento de um microssistema biológico de espécies aracnídeas e similares.
Por fim, quero deixar claro que sempre que existir alguma situação que seja propensa a criar-lhe qualquer tipo de desiquilíbrio emocional pode dirigir-se à minha casa (sabe onde moro) para falarmos pessoalmente e tentarmos resolver o problema. Assim também vai poder deixar de me chamar a mim e à minha família de "esta gentinha" visto que farei questão de lhe dizer os nomes de todas as pessoas que aqui moram.
Sem outro assunto, despeço-me com os melhores cumprimentos.

A vizinha do rés-do-chão." 

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Ontem, Hoje e Amanhã


Já lá vai o tempo em que dava para acreditar em muita coisa que agora se verifica terem sido ilusões ingénuas de quem aprendeu a vida com um formato inadequado para os dias de hoje. Os nossos pais e avós não têm a culpa. Pelo menos na minha família não existem (que eu saiba) futurologistas ou similares. Ao mesmo tempo estes olhos que a terra há-de comer sempre assistiram a um ciclo recorrente com todas as gerações antecedentes à minha: uma inadaptação crescente às mudanças e às novas realidades. Mas não me venham cá com tretas. Os últimos dez anos foram uma violência no que respeita à quantidade de mutações do mundo e de tudo o que nele existe. Em psicologia existe uma designação para as gerações que estão entaladas entre outras duas - a geração sanduíche. Eu não olho para mim como uma sandes. Vejo-me como uma tosta. É que uma sandes ainda pode trazer um imaginário gustativo de salivar e de bradar, com um pão fôfo, de sementes, vegetais frescos, queijo e afins. A tosta remete para paladares igualmente agradáveis para as papilas da degustação, mas é esmagada e pode, facilmente, ficar toda queimada. Não quero com isto dizer que os nossos pais foram alvo de uma vida facilitada linear, até porque eles sentiram na pele a mudança de um regime ditatorial para outro que agourava liberdades (que agora estamos a deitar à rua com um desdém de ir às lágrimas). Mas a mudança deles foi positiva. Começaram a poder ler livros e informação fidedigna, a ouvir música, a combinar reuniões de grupos e amigos, a trabalhar para o que estudaram e a ter acesso a um mínimo de condições para uma vida condigna. A minha (nossa) geração viu o exemplo deles, aprendeu através de metodologias de observação participante e assimilou consciente e inconscientemente que o percurso da vida é regido por concretizações de alguns sonhos. Mas foi sol de pouca dura. Durou até uma determinada altura - até à idade em que deixamos a crise da adolescência para trás e enfrentamos a idade adulta e a crise socio-económica. Tudo parecia ir no caminho esperado, mas de repente a coisa descarrilou. Ou melhor, começou a fazer inversão de marcha. É como estar no comboio, depois de ter comprado o bilhete para um destino e, sem aviso, as carruagens começarem a andar para trás mesmo antes de chegarem ao destino. Irónico. O sorriso  e bem-estar que começam a instalar-se em nós por estarmos a chegar onde queremos é substituído por um estado de confusão mental - "mas o que é que é esta porra?" - e começa a entrar no desespero - "mas para onde é que me estão a levar?!?" - acompanhado por uma boa dose de revolta - "eu não quero ir para aí!!!". Depois, constatamos que a vida é como um livro Kafkiano, em que tudo o que acontece foge ao nosso controlo e que nem a merda do caminho pelo qual queremos ir podemos escolher. E não é por não existir. É pura e simplesmente porque não. Aliás, não é só porque não. Todos sabemos que existem interesses por detrás dessa obrigatoriedade adjacente às proibições de circulação e ao livre arbítrio, mas é cansativo falar nisso. Se eu soubesse o que sei hoje nunca tinha contraído um crédito para comprar casa ou fosse para o que fosse. Tem a sua graça usar-se a palavra "contrair" para nos referirmos a créditos. É como uma doença - contrair ébola, dengue, tuberculose, etc. Em vez disso, guardava o dinheiro debaixo do colchão e nunca tinha depositado os tostões em qualquer entidade bancária. Depois, tinha ido viver para o Tibete e levava o colchão comigo. Chegada à terra, começava a fazer serviço comunitário. Convenhamos que só na sociedade ocidental é que é preciso ir para a universidade para aprender a ajudar os outros. A seguir tinha as gémeas. Elas, provavelmente, iam apaixonar-se por um monge e o amor impossível levá-las-ia a emigrarem para o ocidente para estudarem Belas Artes (que é o que estão a fazer agora). E eu ficava por lá, sozinha, e tornava-me numa monge também porque atualmente as mulheres já o podem fazer. E a estas horas não estava aqui a escrever reflexões pessoais que não interessam nem ao menino Jesus (incluindo o do benfica).  

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Volta ao Mundo em Dez Minutos

Se pensarmos bem, Portugal não é dos piores países do Mundo. E quando feita a velha analogia da esponja, ao espremer, até sai gota. É preciso é espremer com muita força e com a persistência de um pit bull - não largar. Depois do pingo cair há que relativizar. Pensar que existem piores e escrever uma lista com o rol desses exemplares para que nos dias em que acharmos que este país não presta possamos aceder ao lembrete sem ser preciso voltar a fazer o grande esforço de encontrar os defeitos de terceiros que elevam Portugal a um estatuto de éden. Por exemplo: o Botsuana. O que é que existe no Botsuana? Malária, paludismo e vida selvagem. Ninguém consegue tirar partido da vida selvagem quando está com 42º de febre ou com diarreia persistente. Na Índia as coisas pioram - se nascemos mulher corremos o risco de ser mortas à nascença pelos nossos próprios pais. É o chamado generocídio e advém dos dotes que os pais das mulheres são obrigados a pagar à família do seu futuro marido. Só que o problema é que os pais são pobres e não têm nada para oferecer e preferem matar a filha a terem que carregar com esse peso para o resto da vida. Os EUA quase que dispensam apresentações. A grande potência detentora de grande parte dos maiores poderes políticos, económicos e pessoas psicopatas, é também uma das maiores poluidoras do Mundo inteiro. A outra é a China. As pessoas já nem vêem o sol ao natural tal é o grau de poeira no ar e têm que usar máscaras para filtrarem uma percentagem dessa poluição de maneira a conseguirem respirar um bocado melhor e tentarem garantir uns anos a mais de longevidade. Viajemos até à Palestina. Aqui os atentados contra os direitos humanos também são desumanos. São despejados, mortos, espancados e aterrorizados diariamente só pelo simples facto de terem nascido palestinianos. Aliás, já quase nem existe este território. Na prática, a maioria dos palestinianos está espalhada por campos de refugiados que os acolheram e ajudaram a escapar a um destino fatal. Ao voarmos para outro continente, podemos chegar a Angola. Neste país os ricos vivem em verdadeiras fortificações, rodeadas de seguranças e dispositivos que os protegem daqueles que não têm dinheiro para comer. São oásis em redomas, onde a realidade circundante consegue permanecer longe da vista e, consequentemente, longe do coração. O presidente de Angola e a sua família são das pessoas mais ricas do Mundo e o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do país é dos mais baixos. É como no Brasil. Uns muito, muito ricos e uma grande maioria muito, muito pobre. Depois, a maioria começa a ficar revoltada e o resto da história já se sabe. Vamos agora até Inglaterra. Aqui não há muito para dizer. O facto de no país viverem ingleses é mais do que suficiente. França equipara-se às terras britânicas mas com a agravante da extrema direita estar a ganhar terreno. Portanto, não se pode emigrar para lá. Corremos o risco de levar uma bastonada na cabeça ao chegar ao aeroporto por parte de algum xenófobo enraivecido e com a cruz suástica tatuada na testa. A Alemanha não conta. Só dizer e/ou escrever o nome já dá arrepios, quanto mais imaginar viver lá. A Ângela e a sua ocupação económica ditatorial em toda a Europa faz desse território um lugar inabitável para pessoas equilibradas. E o mesmo acontece em cada um dos países que me estão a vir à memória neste momento: são lugares inabitáveis por uma ou outra razão. Portugal também é, mas temos o sol, a sardinha, o fado e a saudade. Talvez possa considerar a Papua Nova Guiné como ponto geográfico minimamente aceitável para se viver e, por isso, concluir que seja o único país do Mundo melhor do que o nosso.