segunda-feira, 7 de julho de 2014

Ontem, Hoje e Amanhã


Já lá vai o tempo em que dava para acreditar em muita coisa que agora se verifica terem sido ilusões ingénuas de quem aprendeu a vida com um formato inadequado para os dias de hoje. Os nossos pais e avós não têm a culpa. Pelo menos na minha família não existem (que eu saiba) futurologistas ou similares. Ao mesmo tempo estes olhos que a terra há-de comer sempre assistiram a um ciclo recorrente com todas as gerações antecedentes à minha: uma inadaptação crescente às mudanças e às novas realidades. Mas não me venham cá com tretas. Os últimos dez anos foram uma violência no que respeita à quantidade de mutações do mundo e de tudo o que nele existe. Em psicologia existe uma designação para as gerações que estão entaladas entre outras duas - a geração sanduíche. Eu não olho para mim como uma sandes. Vejo-me como uma tosta. É que uma sandes ainda pode trazer um imaginário gustativo de salivar e de bradar, com um pão fôfo, de sementes, vegetais frescos, queijo e afins. A tosta remete para paladares igualmente agradáveis para as papilas da degustação, mas é esmagada e pode, facilmente, ficar toda queimada. Não quero com isto dizer que os nossos pais foram alvo de uma vida facilitada linear, até porque eles sentiram na pele a mudança de um regime ditatorial para outro que agourava liberdades (que agora estamos a deitar à rua com um desdém de ir às lágrimas). Mas a mudança deles foi positiva. Começaram a poder ler livros e informação fidedigna, a ouvir música, a combinar reuniões de grupos e amigos, a trabalhar para o que estudaram e a ter acesso a um mínimo de condições para uma vida condigna. A minha (nossa) geração viu o exemplo deles, aprendeu através de metodologias de observação participante e assimilou consciente e inconscientemente que o percurso da vida é regido por concretizações de alguns sonhos. Mas foi sol de pouca dura. Durou até uma determinada altura - até à idade em que deixamos a crise da adolescência para trás e enfrentamos a idade adulta e a crise socio-económica. Tudo parecia ir no caminho esperado, mas de repente a coisa descarrilou. Ou melhor, começou a fazer inversão de marcha. É como estar no comboio, depois de ter comprado o bilhete para um destino e, sem aviso, as carruagens começarem a andar para trás mesmo antes de chegarem ao destino. Irónico. O sorriso  e bem-estar que começam a instalar-se em nós por estarmos a chegar onde queremos é substituído por um estado de confusão mental - "mas o que é que é esta porra?" - e começa a entrar no desespero - "mas para onde é que me estão a levar?!?" - acompanhado por uma boa dose de revolta - "eu não quero ir para aí!!!". Depois, constatamos que a vida é como um livro Kafkiano, em que tudo o que acontece foge ao nosso controlo e que nem a merda do caminho pelo qual queremos ir podemos escolher. E não é por não existir. É pura e simplesmente porque não. Aliás, não é só porque não. Todos sabemos que existem interesses por detrás dessa obrigatoriedade adjacente às proibições de circulação e ao livre arbítrio, mas é cansativo falar nisso. Se eu soubesse o que sei hoje nunca tinha contraído um crédito para comprar casa ou fosse para o que fosse. Tem a sua graça usar-se a palavra "contrair" para nos referirmos a créditos. É como uma doença - contrair ébola, dengue, tuberculose, etc. Em vez disso, guardava o dinheiro debaixo do colchão e nunca tinha depositado os tostões em qualquer entidade bancária. Depois, tinha ido viver para o Tibete e levava o colchão comigo. Chegada à terra, começava a fazer serviço comunitário. Convenhamos que só na sociedade ocidental é que é preciso ir para a universidade para aprender a ajudar os outros. A seguir tinha as gémeas. Elas, provavelmente, iam apaixonar-se por um monge e o amor impossível levá-las-ia a emigrarem para o ocidente para estudarem Belas Artes (que é o que estão a fazer agora). E eu ficava por lá, sozinha, e tornava-me numa monge também porque atualmente as mulheres já o podem fazer. E a estas horas não estava aqui a escrever reflexões pessoais que não interessam nem ao menino Jesus (incluindo o do benfica).  

Um comentário:

  1. .." Depois, constatamos que a vida é como um livro Kafkiano, em que tudo o que acontece foge ao nosso controlo e que nem a merda do caminho pelo qual queremos ir podemos escolher.."

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