quinta-feira, 21 de agosto de 2014

O Meu Tipo

Cada pessoa que tenho conhecido ao longo destes anos que já prefazem a meia idade afirma a pés juntos que não tem um tipo de homem ou de mulher preferencial. Sejam heteros, gays ou mistos, todos atiram para o ar a ideia de que a tipologia que mais os atrai é inexistente dando por isso a entender aquilo que já é universalmente sabido: "O amor não se escolhe. Acontece." Até certo ponto concordo, mas podemos dissertar nem que seja na imaginação sobre o perfil do género preferencial que mais se aproxima do nosso ideal. Eu, cá para mim, (e agora para todos) assumo que tenho um tipo de gajo. Essa ideia está-me tão nítida na cabeça  que se torna viável de a transportar para o universo físico das palavras escritas através de uma descrição adjetivada pormenorizadamente, a começar na unha do dedo grande do pé e a acabar na ponta do cabelo mais espetado. Gosto de homens suficientemente inteligentes e que, por esse motivo, não sentem a constante necessidade de o demonstrar. Do tipo dos que questionam tudo o que sabem e o que não sabem para ainda saberem mais. Ou seja, o meu homem ideal, por ser sábio, é meigo, respeitador, acalorado mas com a mesma dose de arrojo e surpresa sem as monotonias associadas aos ratos de biblioteca. Com surpresas na manga e, essencialmente, na cabeça. Esse homem é rico em ideias e milionário na capacidade de me fazer sentir uma rainha sem luxos advindos da matéria. Também tem que ser justo e conhecer a fundo o verdadeiro significado da palavra "ética". Não pode, portanto, ter o pescoço com uma curvatura angular na sua própria direção que o obrigue a ver-se apenas a si próprio. Os narcisos estão, assim, riscados da lista. Gosto de tipos a quem costumo chamar "cowboy giver". Gajos com espinha dorsal na alma, que pisam o palco da vida com firmeza e solidez, mas que têm um coração amanteigado incapaz de pisar os outros. Para além deste perfil, que considero ser a composição básica para um tipo poder passar à fase do talvez, o meu homem tem que adorar música e cinema. Não é preciso ter um nível cultural literário com graus académicos doutorados. Basta saber um bocado de tudo ao de leve, gostar de ir a concertos e de ver muitos filmes independentes. Nada de filmes mainstream hollywoodescos com cenas megalómanas de carros a alta velocidade, a chocarem de frente e a saltarem de um lado para o outro, com o protagonista a sair ileso. O homem da minha vida gosta de interpretar violências de almas e estados de espírito acutilantemente realistas. Para além destas características ele também deve ser militante convicto do decrescimento da matéria e, assim sendo, viver de acordo com o que diz, sem meias verdades ou postura de farsolas. E - muito importante - não quero ser eu a ensiná-lo. Ele já tem que ser assim, com defeitos ajustáveis aos meus, mas virtudes que me façam olhar para ele diariamente como o homem da minha vida. A honestidade também é palavra de ordem. Eu sou muito liberal e libertária mas o meu disco rígido foi formatado nos anos 80 e 90, altura em que a poligamia e a mentira eram tabu. Agora já não vou a tempo de o transformar numa versão mais moderna. Só indo para o lixo e comprando um novo o que faria com que eu própria deixasse de existir. E também não quero ser eu a pedir-lhe para ser assim. Ele tem que sentir isso na verdade. Na verdade dele. Um outro ponto essencial para uma relação aprazível é o mandatório do meu par ter que abominar ideais neo-liberais e pró-capitalistas. Mas escrever isto é uma redundância porque se comecei o texto por dizer que o homem ideal é sábio, é óbvio que não pode ser de direita. O exterior do meu cavaleiro andante não é importante. Mas só o quanto baste. Não sou fã de gajos-tipo-ken. Antes pelo contrário: idolatro toda e qualquer fisionomia que se assemelhe a imperfeições com peso e medida. Do tipo do Vincent Gallo. Aliás, iguais ao Vincent Gallo. Um homem assim levava-me ao altar. Um tipo justo, honesto, com grandes ambições intelectuais e igual ao Vincent Gallo. Deve ser por isso que nunca fui lá (ao altar).

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