terça-feira, 17 de junho de 2014

Antecipação de um exame custoso

A história começou há uns meses atrás quando fui a uma consulta à médica de família. O que pelo intermédio aconteceu não interessa nada - um rol de burocracias, papeladas, idas e vindas, mudanças de códigos da requisição, mudança de requisição, etc. Para quê? Para duas coisas: a primeira, lavar o aparelho gastrointestinal; a segunda, fazer uma colonoscopia. Já muitos passaram por esta experimentação física que, de tão agonizante, dá vontade de rir às bandeiras despregadas. É que o propósito da coisa é limpar a porcaria para que os "sô dôtores" possam espreitar cá para dentro como se entrassem num hall de casa desinfetado por um mordomo obsessivo-compulsivo que usa algodão para verificar se restou algum miligrama de merda. Esta água barrenta, com sabor a esgoto mas com uma aparência enganadora de lagoa azul transparente, faz mal à saúde. A tarde foi de vómitos, com calafrios, nós no estômago e língua alixada. Horas a fio a assistir aos banquetes elaborados pelos compinchas cá de casa sem poder ingerir uma migalha que fosse a não ser o preparado com nome de lixívia tradicional. Idas à casa de banho com agoiros de momentos dolorosos sem a concretização do ato. E, por fim, ao início da terceira litrosa da mistela, dá-se a ordem de soltura daquilo que ninguém quer ver, cheirar, provar ou verbalizar: cocó. Cocó a jorro. Em abundância. Até se desmaterializar da forma fálica pela qual é universalmente conhecido e tornar-se numa aguada singela mas matreira capaz de enganar os intestinos mais sabidos, com escapadelas infinitas pelas portas das traseiras (leia-se traseiro s.f.f.). Agora, com o relógio a avisar-me que daqui a umas horas a coisa vai inverter-se e que o que hoje saiu, amanhã vai entrar mas com novas formas, cores diferentes e matéria-prima produzida pela mão do homem, vou dormir com um alívio grande da cintura para baixo e um medo de peso do pescoço para cima.
Era tão bom que houvesse um preparado equivalente para o cérebro das pessoas.


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